Karyna Gomes é uma filha da independência. Nasceu em Bissau em 1976. É cantora e jornalista, encontra na música uma forma de expressão das suas causas, tem como palavras nucleares: luta, mulher, liberdade. Vive em Portugal desde 2011.

Katia Guerreiro nasceu na África do Sul em 1976. O imaginário da sua família passou do espaço infinito de Angola para a circunscrição insular dos Açores. Mudou-se para Lisboa para estudar Medicina, mas é no Fado que todos nós lhe conhecemos o seu nome. Tem uma forma de cantar única, sempre com as mãos atrás das costas e algo que lhe é muito característico: brincos de filigrana.

Paulo Duarte é um padre jesuíta e todos seus dias são guiados pelos verbos: questionar, rezar, duvidar, fazer, refletir sobre o sentido e a falta de sentido. O que é inesperado neste homem é ter sido primeiro comissário de bordo e depois padre, o modo como veste e comunica, fazer psicoterapia e dizê-lo. E tudo isso ser compatível com votos de pobreza, castidade e obediência. Nasceu no Algarve em 1979. É filho único e vive em Braga.

Mariana Leitão é deputada e nasceu em 1982. Portugal nunca teve uma mulher na presidência da República. Nunca. O direito pleno ao voto só foi consagrado às mulheres depois da Revolução de Abril. Mariana Leitão, nascida em democracia, nunca falhou uma eleição e é a candidata da Iniciativa Liberal às presidenciais do próximo ano. Estudou Relações Internacionais, foi gestora. Gosta de jogar bridge e tem 2 filhas.

Raquel Ribeiro nasceu no Porto, em 1980. É jornalista, escritora e professora universitária. Raquel nunca foi a Luanda. O pai trabalhou na ponte aérea até ao último voo de regresso de Luanda, no dia 11 de Novembro de 1975. Ou seja, a data de independência de Angola. Enquanto investigadora, as relações entre Cuba e Angola e os temas pós coloniais são linhas preponderantes no seu trabalho, e atravessam, também, o seu romance Este Samba no Escuro, publicado em 2013.

António Brito Guterres nasceu em 1978. É assistente social e investigador em estudos urbanos. Cresceu em Arroios num contexto de privilégio, mas atualmente trabalha em bairros pobres. É uma pessoa que gosta do fazer, do contacto direto e de estar no terreno. A geração dos seus pais é aquela que fez o 25 de Abril. A sua é a que se manifesta, reivindica, denuncia o que foi manchado desse dia. Há um ano, António Brito Guterres escreveu que "uma revolução não se fez, faz-se, é um estado permanente".

Leopoldina Fekayamãle nasceu 20 anos depois da independência de Angola. É do grupo étnico ovimbundo oriundo do planalto central angolano, região especialmente afetada quer nos anos 60 durante a guerra anticolonial, quer depois de 75 na guerra civil que, com intermitências, decorreu até 2002. Leopoldina nasceu em 1995 e cresceu na cidade do Namibe, está em Portugal a fazer um doutoramento sobre História contemporânea. Agualusa já a desafiou a escrever a história do seu país.

Hannah Nafize Madatali nasceu em 1997 é muçulmana, tem raízes moçambicanas e indianas. Pai e mãe pertencem ao grupo de milhares de pessoas que vieram para Portugal nos anos 70 com o desmoronar do império colonial. Por acaso, Hannah nasceu em Cambridge, onde mais tarde faria o mestrado. Estudou em Portugal, no País de Gales, nos Países Baixos. Atualmente é funcionária da União Europeia.

Martino Gliozzi veio fazer o internato em 2009 e ficou por cá. Desde de 2016 que coordena o Centro de Saúde do Martim Moniz, em Lisboa, e acabou com as filas de espera no posto médico da Baixa. Nasceu em em 1983 em Bolonha. Desce a avenida nas manifestações do 25 de abril com a sua t-shirt de Partigiani. Desde 1946 que o 25 de Abril é também feriado em Itália. A festa assinala de forma simbólica a libertação da ocupação nazi e a derrota do regime fascista de Mussolini.

Maria José Lobo Antunes nasceu em 1971. Na sua primeira infância, o seu pai estava em Angola, na guerra colonial. Enquanto antropóloga e investigadora trabalha o tema da memória colonial. Para o seu filho, José Lobo Antunes, nascido em 2000, as narrativas desse tempo naturalmente têm outro peso e distância. Mas são sempre História e biografia. A nossa, a dos nossos pais e avós.

Vasco Pereira Coutinho nasceu em 1987 e foi um aluno péssimo. Passou pelo seminário. Hoje é humorista e ator. A Professora Regina, a Enfermeira Lurdes e a Tia Bli são as suas personagens mais famosas. Tem mais de 100 mil seguidores no Instagram e faz publicidade a marcas de luxo. Há uma nova forma de comunicar, que não dispensa as redes sociais e que, por vezes, recorre ao humor.

Tânia Graça é psicóloga e sexóloga. Nasceu em 1991. Nos últimos anos os seus trabalhos têm-se focado no empoderamento feminino, sexualidade e relacionamentos. É importante perceber a sociedade e o tempo em que vivemos, onde se fala explicitamente de sexualidade feminina e se os números de violência doméstica e no namoro são assustadores? O que persiste de um machismo que obrigava as mulheres a terem autorização dos maridos para viajar, 50 anos depois do 25 de Abril, quando a igualdade está consagrada na Constituição e os passos dados são gigantescos? Aparentemente estes termos são contraditórios e não têm relação entre si, mas coexistem.

Edalina Sanches é doutorada em Ciência Política. É uma académica cuja pesquisa incide sobre os processos de democratização, novos partidos e novas atitudes políticas em África. Nasceu em Espanha em 1980 e tem raízes cabo-verdianas.

Miguel Prata Roque é o primeiro licenciado da família. Os seus dois avós começaram a trabalhar aos 10 anos. Pertence à chamada geração rasca, participou em manifestações onde se contestavam as provas globais. Aprendeu na terceira classe, como então se dizia, o significado da palavra: contestatário. Nasceu em 1978 e formou-se em Direito, o arguente das provas de doutoramento foi Marcelo Rebelo de Sousa. Anos mais tarde, foi Secretário de Estado da Presidência.

Uma folha em branco nunca está inteiramente em branco. Mas em oito anos, um país pode mudar como se começasse do zero e a vida de uma família reflete algumas dessas mudanças. Entre 1971 e 1979 fez-se a Revolução, que permitiu liberdade de expressão, liberdade de associação, eleições livres, a concretização dos três D"s: desenvolver, democratizar, descolonizar. Além das mudanças que podemos fixar no calendário, como a Constituição em 1976. Para tentar perceber como é que dois irmãos, de géneros diferentes, viveram e o que se seguiu a este tempo de mudança convidamos Ana Markl, autora e apresentadora, e o humorista Nuno Markl.

Margarida Pinho e Teresa Coutinho são mãe e filha. São também mulheres, sujeitos individuais, com as suas biografias, escolhas e contingências. São as duas muito politizadas. Margarida nasceu em 1956, foi professora, pertenceu à UEC antes da Revolução, votou pela primeira vez nas primeiras eleições livres, há 50 anos. Teresa é atriz e encenadora, nasceu em 1988, numa altura em que ser homossexual já não era crime.

Quando é que terminou a ditadura militar brasileira? Não há uma data precisa, ainda que se aponte 1985 como o ano do fim. Quando Rafaela Cardeal nasceu, em 1989, o Brasil vivia sob a presidência de Sarney. A investigadora em literatura brasileira, imigrante em Portugal há 8 anos, demorou tempo a compreender os vestígios desse regime, autoritário e nacionalista, na sua infância e na vida da família. Mas muito desse período sombrio ainda sobrevive. Fez um doutoramento sobre o poeta João Cabral de Melo Neto, cônsul no Porto entre 1985 e 1987.

Carlão é aquele que nunca deixou de olhar para si como um puto. Aquele que está na batalha e não desiste de mudar o mundo. Este ano faz 50 anos, usa uma t-shirt onde se lê "da margem sul", o que é uma afirmação política, como o seu nome no Instagram: Carlão Na Batalha. Tem olhos verdes que talvez venham de Cabo Verde, berço de pai e mãe. Mas ele veio ainda bebé de Angola, onde nasceu.

Um tecido é muitas vezes usado como metáfora do Tempo. Há um entrelaçado, um movimento de um tear imaginário que nos dá uma coesão final, um mosaico com um desenho específico. Por isso, o tempo que nos precede, o dos nossos pais e avós, está também investido em quem somos, por mais que façamos novas modelagens. Nuno Baltazar é designer de moda, nasceu em 1976. A sua criação transporta uma herança e reflete um tempo novo, a identidade de um país e de um homem que cresceu em democracia.

Já não há casamentos forçados na comunidade cigana. Mas há uma pressão e uma expetativa sobre as mulheres no sentido de cumprirem um destino, casarem aos 14 anos e dedicarem a sua vida a servir a família. Vanessa Lopes nasceu em 1994 e só tinha o 9º ano aos 18 anos. Não foi estimulada pelos pais a continuar os estudos. Licenciou-se em Ciências da Comunicação, está a fazer um mestrado em Ciência Política, é jornalista, preside à associação Rizoma que promove a integração da comunidade cigana na sociedade.

Sinho Pina nasceu em Lisboa em 1976. Pai cabo-verdiano e mãe angolana. Viveu nas Fontaínhas. Começou a trabalhar nas obras ainda adolescente, retomou os estudos mais tarde. Fez a tropa, é vigilante e dinamizador sociocultural. Vive no Casal da Boba, um dos bairros onde realojaram muitas pessoas de bairros demolidos da Amadora.

Ângela Ferreira nasceu em 1958 numa cidade que então se chamava Lourenço Marques. Estudou e viveu na África do Sul durante o Apartheid, doutorou-se nas Belas Artes, em Lisboa, onde ensina. Escultora, os temas coloniais e pós-coloniais são o cerne da sua pesquisa e reflexão. Nuno Nunes Ferreira é também artista plástico, nasceu em 1976, já em liberdade. Trabalha os temas da Memória e do Arquivo, deu como título a um projeto: Nada pela Nação. Vive em Santarém, onde começou a nossa madrugada inteira e limpa.

É uma mulher, negra, portuguesa, de origem angolana e são-tomense. Acerca de cada uma destas palavras, e da intersecção entre elas, muito há a dizer. Raquel Lima nasceu em 1983, é poeta, artista transdisciplinar e investigadora de temas pós-coloniais do CES, em Coimbra. Na sua prática e investigação procura tornar visíveis (e audíveis) temas como racismo, identidade, pertença

Carla Matos Gomes é filha do militar mais condecorado do país. Um dos primeiros a participar no projeto da Revolução que mudaria as nossas vidas. Carla nasceu em 1975, já em liberdade, é assessora de comunicação, tem 2 filhos. Este é um ano particular na sua vida. Fez 50 anos, o pai morreu em abril. Temos apenas uma pergunta: Como lhe foi contado o 25 de Abril?